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Gestos, 32: do enfrentamento ao HIV à diplomacia cidadã

Em 1993, quando fundamos a Gestos, em pleno coração do Recife, o mundo enfrentava uma das maiores crises sanitárias da história moderna: a pandemia da Aids.

Alessandra Nilo

Publicado: 28/05/2025 às 11:07

Solenidade de Lançamento Da Campanha de Ampliação de Testagem do HIV da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)/Fotos: Erasmo Salomão

Solenidade de Lançamento Da Campanha de Ampliação de Testagem do HIV da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) (Fotos: Erasmo Salomão)

Em 1993, quando fundamos a Gestos, em pleno coração do Recife, o mundo enfrentava uma das maiores crises sanitárias da história moderna: a pandemia da Aids. Havia medo, estigma e uma urgência vital por respostas.

Hoje, ao celebrarmos 32 anos de atuação ininterrupta, reconheço com orgulho o caminho percorrido e reafirmo: a Gestos é, acima de tudo, uma organização que nunca deixou de atuar no presente, olhando para o futuro.

Desde o início, compreendemos que não seria suficiente oferecer apoio individualizado sem enfrentar as estruturas que produzem a vulnerabilidade das pessoas ao HIV. Por isso, sempre caminhamos lado a lado com a defesa intransigente dos direitos humanos, cuidando das pessoas vivendo com HIV/Aids, acolhendo e oferecendo serviços gratuitos de alta qualidade, mas também provocando debates, questionando, propondo soluções e incidindo diretamente sobre políticas públicas.

Ao longo dessas três décadas, a Gestos amadureceu. Crescemos para além da pauta do HIV, sem jamais abandoná-la. E crescemos para além do Recife: estamos no Brasil e no mundo, nos somando às pautas feministas e antirracistas, da população LGBTQIAPN+, das juventudes, promovendo a saúde universal e pública, os direitos sexuais e reprodutivos, formando profissionais de diferentes campos e, sempre, acima de tudo, defendendo as pessoas historicamente marginalizadas.

E quanto mais nossa atuação foi se tornando mais interseccional, tornou-se também mais internacional.

Hoje, a Gestos não apenas participa, mas incide diretamente nos espaços de tomada de decisão global, desde 2001. E isso foi reconhecido em 2017, quando conquistamos o status consultivo especial junto ao ECOSOC da ONU. Participamos de negociações cruciais, como a da Agenda 2030, e fomos fundamentais para que pessoas vivendo com HIV e pessoas trans fossem visibilizadas nos documentos internacionais.

Representamos a América Latina e o Caribe em incontáveis fóruns internacionais, em Conselhos Diretores (inclusive da Unaids, o Programa da ONU para Aids) e temos liderança reconhecida nos mecanismos de participação da sociedade civil — seja nos conselhos locais e nacionais, nas Nações Unidas, no G20 ou em espaços de debate sobre o financiamento para o desenvolvimento sustentável.

Não achando pouco, inventamos o “Relatório Luz da Sociedade Civil para a Agenda 2030”, hoje uma referência consolidada e exemplar de como monitorar, de forma rigorosa e eficaz, os compromissos assumidos pelo Brasil nos fóruns globais.

Nada disso seria possível sem a dedicação incansável de uma equipe multidisciplinar que considero brilhante, e que nos garantiu nosso maior sucesso: a confiança de milhares de pessoas e das organizações parceiras que nos apoiam e caminham conosco.

É lindo ver o caminhar dessa ONG que nunca se furta a questionar e denunciar, mas que também sabe dialogar e construir.

O que desejo para a Gestos hoje? Que, nos próximos anos, continue a formar ativistas, a produzir conhecimento e a propor estratégias coletivas, para que siga sendo sempre um espaço de resistência e esperança. Que continue esse caminho — e outros — construindo pontes entre o local e o global, entre a urgência e o planejamento, entre o cuidado e a política.

Porque, enquanto houver desigualdade, haverá sempre muitas razões para a Gestos existir.

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